Eu, autista.


Sabe qual o maior problema de se possuir algum grau dentro do espectro autista?


É o que chamam de hiperfoco.


Isso realmente é um saco. E para um não diagnosticado, a coisa é um pouco pior. Digo isso porque só fui "diagnosticado" depois dos 40 anos e como ouvi de vários profissionais, "não há muito ou quase nada o que fazer".


O hiperfoco me prejudica muito. No meu trabalho, no meu casamento, na família. É uma luta constante. Socialmente é muito difícil, fazer amizades chega a ser doloroso. Os assuntos que gosto de falar são muito específicos e não consigo, por mais que me esforce, criar interesse em conversas casuais de assuntos aleatórios. Me sinto excluído, não que as pessoas com quem convivo me excluam, mas porque excluo a mim mesmo, me afasto porque acredito que o que tenho para compartilhar não é do interesse geral.


Afinal, quem vai se interessar em conversar sobre um livro de ficção obscuro que só 0,25% dos 52% da população brasileira que lê livros saberia do que estou falando? Ou daquela série de TV que só umas 4 pessoas no planeta assistem?


E por mais que as pessoas pensem que eu vivo isolado no meu mundinho e estou bem com isso, elas estão erradas. a falta de orientação nos anos de formação, a primeira infância, cobra um preço alto de mim hoje. Não entendo os sentimentos das pessoas, não enxergo o mal que meu isolamento causa em minha esposa e filhos. Muitas crises tiveram isso como causa.


No meu caso, isso aconteceu puramente por falta de informação. Não havia acesso a profissionais ou terapias. Lembro que ouvi falar de autismo pela primeira vez quando assisti Rain Man.


Esse texto é meio que um desabafo mas também um apelo que faço a você, leitor. Se vc tem alguém por perto que acredita estar em algum grau do espectro autista saiba que ele não te ignora porque quer, as vezes ele só quer que alguém demonstre algum interesse em conversar com ele. Aposto que você vai se surpreender com o que ele pode oferecer.


Mas se vc é pai ou mãe, e vê que seu filho não se comporta como a maioria das crianças. É difícil conversar com ele ou ele simplesmente parece não se importar com os outros membros da família. Não desista dele. Leve para uma avaliação séria, quanto mais cedo na vida melhor! 


O autismo moderado e grave recebem mais atenção pois são condições com características bem chamativas. O grau leve meio que voa abaixo do radar e é confundido com rebeldia, teimosia, comportamento anti-social, manha, mimo, mal criação, TDAH. Não estou dizendo que todas as crianças que apresentam tal comportamento estão no grau leve do espectro autista, mas é sempre bom averiguar, não é mesmo?


O diagnóstico precoce ajuda na evolução social e mental da criança, digo isso poque tenho dois filhos diagnosticados na infância graças à minha maravilhosa esposa que, não sei como, teve a luz de alerta acionada. e a ela agradeço muito pelo que está fazendo por eles. Hoje sei que eles serão adultos muito mais aptos socialmente do que o pai deles é.

Eu, autista. Eu, autista. Reviewed by Tulio Roberto on 6/27/2023 05:16:00 PM Rating: 5

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